Com a taxa de juros mais alta do país, em 445,7% ao ano, o rotativo do cartão de crédito, acionado automaticamente quando o cliente não paga o valor integral da fatura e joga a dívida para o mês seguinte, deve ter suas regras alteradas por um projeto de lei que tramita no Congresso.
Aprovado na terça-feira (5) pela Câmara e em análise no Senado, o PL do Desenrola Brasil (de renegociação de dívidas) prevê um limite para os juros do rotativo do cartão de crédito caso instituições financeiras não apresentem uma proposta de taxa menor em 90 dias.
Segundo dados do Banco Central, a dívida do rotativo chegou a R$ 76 bilhões no último mês de julho, quase o dobro do registrado no mesmo período de 2021. A inadimplência, de lá para cá, saltou de 28,8% para 49,5%.
Para especialistas consultadas pela Folha de S.Paulo, porém, administrar o cartão de crédito não precisa ser um bicho de sete cabeças, mesmo para quem já lida com dívidas. Confira dicas para fugir –e sair– do rotativo.
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VEJA DICAS NÃO CAIR NO ROTATIVO DO CARTÃO DE CRÉDITO
1 – REDUZA O NÚMERO DE CARTÕES
Para evitar o pagamento de altos juros, o primeiro passo para o consumidor é reduzir o número de cartões de crédito ativos. “O ideal é ter apenas um”, afirma Myrian Lund, professora de MBAs da FGV (Fundação Getulio Vargas) e especialista em finanças pessoais.
“E isso é essencial para quem faz cartão de lojas de departamento. É muito fácil cair no rotativo assim, mesmo que as despesas sejam baixas.”
Concentrar todos os gastos em apenas um cartão ajuda a organizar a vida financeira e a visualizar melhor quais são as despesas da fatura, o limite de crédito disponível e os gastos previstos para o mês seguinte. “Os cartões nos estimulam a gastar mais. Isso [ter apenas um] ajuda a evitar que a coisa saia do controle”, diz Lund.
2 – AJUSTE O LIMITE DO CARTÃO AOS GANHOS MENSAIS
Limites altos no cartão de crédito podem ser a porta de entrada para o rotativo. “É preciso alinhar esse limite à realidade do orçamento”, diz Cíntia Senna, sócia-executiva da Dsop, organização com foco em educação financeira.
“Se eu recebo R$ 1.000 e meu limite é R$ 10 mil, é possível reduzir para controlar os gastos mensais e não cair em armadilhas. Um dos erros mais comuns é tratar o crédito como um dinheiro a mais, e não uma ferramenta para ajudar em aquisições mais caras.”
A especialista diz que antes de fazer qualquer compra é aconselhável checar o limite do cartão, pois isso também evita o excesso de parcelamentos e a bola de neve de dívidas. Outra dica é comprometer, no máximo, 30% da renda mensal com o cartão.
3 – CONTROLE O PARCELAMENTO
Para Myrian, o parcelamento deve ser preferido para gastos maiores, enquanto despesas rotineiras, como mercado e farmácia, devem ser pagas à vista.
O ideal é lidar com até três itens parcelados por fatura. “Três é o que dá para lembrar. Digamos que precise comprar um computador e uma geladeira nova, e também queira planejar as férias. Administre os três e só parcele de novo quando um desses gastos for quitado”, diz ela.
Caso seja difícil colocar em prática de uma vez, comece pagando as parcelas que você já se comprometeu e não parcele mais até quitá-las.
4 – FAÇA UM ‘PÉ-DE-MEIA’
A não ser que o orçamento mensal esteja contado até o último centavo, pegue uma pequena quantia dos ganhos e reserve para eventualidades futuras.
“Assim que receber o salário do mês, crie o hábito de separar um pequeno montante. Pode ser para um gasto maior no futuro, para uma aposentadoria ou mesmo apenas para ter uma musculatura financeira”, aconselha Cíntia. O pé-de-meia pode ser um alívio em momentos de aperto.
“Muitos brasileiros entram no rotativo por não terem o hábito de poupar, por terem aprendido que é preciso gastar tudo que ganham. Guardar uma quantia mensal, mesmo que bem pequena, pode ajudar no futuro.”
VEJA DICAS PARA SAIR DO ROTATIVO
1 – PARE DE USAR O CARTÃO
Se o rotativo já é uma realidade no seu orçamento financeiro, pare de usar o cartão até que a situação esteja controlada. “Evite usar o crédito até conseguir respirar novamente”, diz Cíntia.
Além de evitar novos problemas no futuro, cessar gastos no crédito ajuda o cliente a trabalhar com o dinheiro que ele, de fato, tem —uma lição importante da educação financeira.
2 – ANALISE DESPESAS E GANHOS
Ao entrar no rotativo, estude seus ganhos e despesas principais. “Olhe para dentro de casa e veja o que é possível cortar”, diz Cíntia. “Pode ser delivery de comida, alguns gastos com lazer, aplicativos de transporte…”
É possível, ainda, devolver itens comprados pela internet, desde que seja em até sete dias depois de passar o cartão, e buscar alternativas de renda extra. A devolução, nestes casos, é chamada de direito de arrependimento, vale só para compras online, e está amparada pelo Código de Defesa do Consumidor.
O ideal é fechar essa conta antes da fatura do mês seguinte chegar. Isso evita que a situação se prolongue por mais tempo e que a taxa do parcelamento de crédito incida sem que você esteja preparado para isso.
3 – CONFIRA CONDIÇÕES DE EMPRÉSTIMO E PARCELAMENTO
Se não for possível cortar despesas ou arranjar uma fonte de renda extra, consulte as opções oferecidas pelos bancos. Estude a viabilidade de parcelamento da dívida antes mesmo de entrar no rotativo. Ou veja as condições de um empréstimo pessoal ou consignado, que pode, inclusive, vir de outra instituição com taxas mais atrativas.
“Veja com o gerente do banco qual é a linha de crédito mais barata que ele pode oferecer”, diz Myrian Lund, da FGV. “Empréstimos costumam ter taxas altas, mas menores do que as de parcelamento, rotativo e terminais eletrônicos.”
Em algumas instituições, é possível ainda pedir uma carência de até 90 dias.
“É o tempo de respirar e se reorganizar”, afirma ela.
Empréstimos, porém, exigem muito cuidado. Para Cíntia Senna, eles podem ser a solução mais imediata, mas não resolvem a questão por completo. “O problema maior não é o cartão de crédito, mas o comportamento de consumo”, diz.
“O rotativo é um sinal de alerta para parar, refletir e mudar a rota. Tomar empréstimo sem mudar de comportamento é continuar no mesmo caminho.”
4 – EM ÚLTIMO CASO, DECLARE INADIMPLÊNCIA
Se nenhuma das opções acima estiver ao seu alcance, um último recurso, segundo as especialistas, é declarar a inadimplência.
“Infelizmente, às vezes resulta em mais oportunidades de negociação”, afirma Cíntia.
Assumir que não é possível arcar com as dívidas, porém, não significa que elas irão sumir por completo. O que acontece é uma tentativa de acordo com as instituições financeiras em busca de um pagamento crível e praticável.
Segundo a Justiça, as dívidas não prescrevem em cinco anos e podem continuar sendo cobradas, desde que o consumidor não seja exposto e nem seja de forma vexatória.
Estar inadimplente, no entanto, traz consequências desagradáveis. Além das cobranças, o nome do cliente pode ser colocado nos cadastros de proteção ao crédito, impossibilitando-o de acessar qualquer tipo de crédito.
“Como cartões não têm nenhum bem atrelado, a exemplo de financiamentos de imóveis e automóveis, não existem garantias a serem tomadas pelo banco. A dívida é de dinheiro por dinheiro, e a punição é por cobrança e restrição”, explica Cíntia.
Algumas ações coletivas, como o Desenrola, do governo federal, e Feirão Limpa Nome, da Serasa, também podem ser um bom caminho. Segundo a especialista, a maior parte do público dessas ações é de inadimplentes por uso indevido de crédito.
* TAMARA NASSIF – FOLHAPRESS
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Fonte: Paraíba Online