
Revi Os Dias Eram Assim. A supersérie está no Globoplay. O desempenho de Sophie Charlotte, como a protagonista Alice Sampaio, me motivou a rever Meu Nome é Gal.
Lembro de Sophie Charlotte, com menos de 20 anos, num pequeno papel em Páginas da Vida.Com uns 25, após O Rebu, cantou Sua Estupidez no especial de Roberto Carlos.
Sophie Charlotte é uma atriz que também sabe cantar. É dela uma das vozes da versão de Aos Nossos Filhos gravada para a abertura de Os Dias Eram Assim.
Se estivesse viva, Gal Costa faria 80 anos agora em 2025. Ela morreu aos 77 em novembro de 2022, e Meu Nome é Gal chegou aos cinemas um ano depois.
Num pequeno detalhe, a abertura de Meu Nome é Gal fala sobre o cuidado que as diretoras Dandara Ferreira e Lô Moliti tiveram quando filmaram esse recorte da vida de Gal e mostra como Charlotte, atriz e cantora, está bem fazendo Gal Costa.
No álbum ao vivo Fa-tal, de 1971, há duas versões de Fruta Gogoia. A que antecede Vapor Barato dura cerca de um minuto. Por volta dos 30 segundos, ouve-se um ruído, a plateia ri, e Gal, rindo também, diz “acontece”, antes de retomar a música.
Isso é reconstituído com absoluta precisão na abertura do filme. Quem ouviu Fa-tal dezenas – até centenas – de vezes, espera pelo ruído, pelo riso da plateia e pela fala de Gal. Espera, ouve – tal como está no histórico disco – e agora vê.
Esse detalhe, logo no início do filme, mostra o cuidado com a reconstituição e, de cara, revela a entrega total de Charlotte à personagem e a qualidade do resultado obtido.
Meu Nome é Gal vai de 1966, quando Gal, aos 21 anos, trocou Salvador pelo Rio de Janeiro, até 1971, no momento da estreia do show Fa-tal. O que vemos depois, fechando o filme, é um breve tributo que Dandara Ferreira e Lô Moliti fazem a Gal.
Quando vi Meu Nome é Gal no cinema, em 2023, ouvi de um espectador que Sophie Charlotte não tem o sorriso de Gal Costa, enquanto que uma espectadora disse que sentiu falta da voz de Gal, já que é a atriz que canta boa parte dos números.
Ouço Gal Costa desde 1969 – eu tinha 10 anos, e foi o ano em que ela lançou seu primeiro disco – e não senti falta de nada em Meu Nome é Gal. O filme e suas escolhas.
Não tem isso (o mega sucesso Que Pena), não tem aquilo (Não Identificado), mas tem uma história muitíssimo bem narrada dos primeiros anos da vida pública de Gal Costa.
Meu Nome é Gal se debruça sobre a jovem que deixou Salvador para se tornar uma cantora profissional a partir do Rio de Janeiro e de São Paulo. Sendo assim, insere a personagem no movimento tropicalista, da qual fez parte ao lado dos amigos Caetano Veloso e Gilberto Gil. E, inevitavelmente, fala do Brasil sob a ditadura iniciada em 1964.
É um filme honestíssimo. Alegra, entristece, comove, pode provocar lágrimas – depende da sensibilidade do espectador e dos seus vínculos com a trajetória de Gal.
É também um filme muito necessário pelo reencontro que promove com o Brasil e suas belezas. Sem deixar de mostrar que o Brasil que produz Gal Costa é o mesmo no qual vozes vindas de suas regiões profundas aplaudiam um regime de exceção.
A Gal vista por Dandara e Lô está situada com muita propriedade entre o desejo de cantar, de tornar pública a sua voz cristalina, e o desafio de se inserir num contexto histórico marcado por extrema violência política.
O tropicalismo é um projeto desafiador e ousado arquitetado sobretudo por Caetano e Gil como enfrentamento à caretice que havia na cena musical brasileira. A prisão e o exílio dos dois levou Gal a ser porta-voz do que restou do movimento.
Charlotte encanta e conquista como Gal, enquanto Rodrigo Lelis está ótimo como Caetano. As pessoas que, naquele momento, fizeram parte da vida de Gal – Gil, Bethânia, Dedé e Sandra Gadelha, Guilherme Araújo, Waly, Macalé, Rogério Duarte, Torquato, Dona Mariah, Capinan, Os Mutantes, Duprat, Tom Zé – estão todas no filme.
A cena da gravação de Baby, essa linda canção de Caetano Veloso, me tocou muito particularmente. Tem aquele clima no estúdio, tem Rogério Duprat regendo, tem a voz de Gal Costa no lugar da de Sophie Charlotte, tem o dueto com Caetano.
É forte evocação de um tempo. E confirma o poder da música de ficar guardada e crescer na nossa memória através dos anos. “Baby, baby, há quanto tempo…”.
Clique aqui para ler a notícia em seu site original
Fonte: Jornal da Paraíba